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O Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ministro Luiz Fux, está realizando  esta semana audiências públicas para colher subsídios técnicos e jurídicos a fim de adotar a melhor solução no julgamento das ações diretas de inconstitucionalidade 6.298, 6.299, 6.300 e 6.305, ajuizadas pela CONAMP contra dispositivos do pacote anticrime. Fux é relator da matéria. O Procurador-Geral de Justiça do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), Fernando da Silva Comin, foi um dos expositores nesta terça-feira (26/10). 

Comin se manifestou sobre o acordo de não persecução penal, especificamente sobre os incisos III e IV do caput do art. 28-A do CPP, introduzidos pela Lei 13.964, de24 de dezembro de 2019. Tais dispositivos preveem que o local para prestação de serviços e as entidades destinatárias para o pagamento de prestação pecuniária sejam definidos  pelo juiz de execução penal. "Esses comandos normativos desafiam a própria concepção de sistema acusatório, afrontam a imparcialidade objetiva do juiz e violam  prerrogativa constitucional atribuída ao dominus litis, que é  Ministério Público", afirmou o PGJ catarinense durante a audiência pública. 

Comin ressaltou, ainda, que em todo sistema consensual ou negocial de processo a função do juiz é de garantia dos direitos do investigado, de controle formal de sua voluntariedade e da legalidade do pacto. Isso deve correr sempre com cautela, para que o juiz não assuma uma posição de protagonismo, vulnerando a sua imparcialidade. Nesse sentido, a intervenção de ofício do juiz no mérito do acordo, como previsto nos incisos III e IV do caput do art. 28-A do CPP, interfere na esfera reservada às partes do processo.

"Em coerência com o princípio da imparcialidade, um dos pilares de todo sistema acusatório, o juiz jamais poderá decidir sobre a conveniência na formatação das cláusulas obrigacionais do acordo de não persecução penal,  inclusive no que diz respeito ao local ou  quantum de prestação de serviços e os destinatários da prestação pecuniária, desde que estejam dentro dos limites estabelecidos em lei. Essa avaliação político-criminal cabe exclusivamente ao Ministério Público", defendeu Comin. 


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O PGJ catarinense citou também o enunciado 24 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais (CNPG) que estabelece: "a homologação do acordo de não persecução penal, a ser realizada pelo juiz competente, é ato judicial de natureza declaratória, cujo conteúdo analisará apenas a voluntariedade e a legalidade da medida, não cabendo ao magistrado proceder a um juízo quanto ao mérito/conteúdo do acordo, sob pena de afronta ao princípio da imparcialidade, atributo que lhe é indispensável no sistema acusatório".

"É preciso observar que a definição do destinatário da prestação pecuniária e o local de cumprimento da prestação de serviço comunitário  constitui cláusula material do acordo entre Ministério Público e investigado, acompanhado de seu advogado", ressaltou Comin. O PGJ ressaltou, ainda, que o comando normativo dos incisos III e IV do caput do art. 28-A do CPP incorreu em evidente equívoco quanto à natureza jurídica do acordo de não persecução penal, confundindo as cláusulas do acordo com a sanção penal.

"Nos parece que há confusão entre cláusulas do ANPP com sanção penal. Ou seja, o legislador acabou confundindo os institutos   do acordo de não persecução penal com o própria "plea bargain", onde há imposição de pena, uma vez que na hipótese de descumprimento das condições acordadas sequer será necessária a instrução, mas meramente a execução da pena imposta", sustentou.

A conclusão, então, segundo Comin, é a "inconstitucionalidade nas disposições dos incisos III e IV caput do art. 28-A, do CPP, em razão da prerrogativa constitucional atribuída ao Ministério Público, de titular da ação penal, da violação do sistema acusatório e da imparcialidade objetiva do Magistrado".