O Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), por meio da Promotoria de Justiça da Comarca de São José do Cedro e do Centro de Apoio Operacional do Meio Ambiente (CME), conseguiu reverter no campo extrajudicial possível concessão indevida de licenças ambientais, considerando os potenciais prejuízos ao meio ambiente. Foram encontradas irregularidades nos Decretos Municipais n. 7.629 e n. 7.670 de 2023, que declaravam como de utilidade pública e interesse social determinados terrenos privados em um trecho do curso d´água conhecido como Lageado Cedro.
Na exposição de motivos, ambos os decretos municipais mencionavam o interesse do Município na transformação de canalização de seção aberta para seção fechada, porém apresentando argumentos vagos na descrição e na comprovação da melhoria na proteção das funções ambientais pela medida. Diante disso, a Promotora de Justiça Fernanda Silva Villela Vasconcellos instaurou um procedimento para apurar a questão junto à Prefeitura e solicitou o auxílio do CME para a realização de estudos.
Também foram expedidos ofícios à Gerência Regional de São Miguel do Oeste do Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA) e ao Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento Regional (Conder) questionando se entendiam viáveis as análises de pedidos individuais de licenciamento ambiental para a canalização em seção fechada de pequenos trechos de córrego urbano, pois existem diversos proprietários de imóveis que têm a sua propriedade perpassada pelo curso hídrico, o que poderia gerar danos de ordem urbanística e ambiental, considerando que o córrego perpassa pelo centro urbano de São José do Cedro.
O estudo do CME constatou que o córrego em questão caracteriza uma sub-bacia hidrográfica, o que determina a presença de áreas de proteção permanente em área urbana consolidada. Também foi identificado que o IMA havia concedido ao Município, de maneira equivocada, o Termo de Delegação de Atribuições de Competências Relativas a Licenciamento Ambiental para esse caso, quando era de sua própria competência.
Isso porque o município de São José do Cedro na atualidade não executa as ações de conselho de meio ambiente e atos fiscalizatórios, conforme o Relatório de Constatações n. 115/CME/2023, de 27/10/2023, do Centro de Apoio Operacional do Meio Ambiente, que realizou amplo diagnóstico do SISMUMA no referido município, o que afronta o art. 5º da Lei Complementar Federal n. 140/2011. De acordo com a Lei, para que a delegação das atribuições de licenciamento ambiental entre estado e município ocorra é necessário que o ente destinatário da delegação disponha de órgão ambiental capacitado a executar as ações administrativas a serem delegadas e de conselho de meio ambiente.
Pelos motivos expostos, ficou comprovado o não atendimento da totalidade dos requisitos para o exercício do licenciamento ambiental, conforme a Resolução CONSEMA 117/2017, concluindo-se que essas inconsistências "afetam a qualidade do licenciamento ambiental de atividades geradoras de impacto local pelo Município de São José do Cedro".
Sobre os decretos municipais revogados, a Pesquisa SIG n. 128/2023, emitida pelo Centro de Apoio Operacional do Meio Ambiente do Ministério Público de Santa Catarina, observou a ausência de menções e comprovações sobre a melhoria das funções ambientais proporcionadas pela canalização em seção fechada do curso hídrico e a falta de atestado sobre a inexistência de alternativa técnica e/ou locacional à atividade proposta, além da relevância eminentemente privada de tal medida, pois seriam executadas pelos proprietários interessados e não pela Prefeitura, não havendo a demonstração efetiva de utilidade pública.
Após tomarem ciência dos estudos desenvolvidos pelo MPSC, o IMA decidiu pela revogação do termo de delegação pela autarquia com base no princípio da autotutela, inclinando-se à posição do CME/MPSC. Em consonância, o Conder informou que promoveu o arquivamento do licenciamento ambiental, e a Prefeitura de São José do Cedro informou sobre a anulação dos Decretos Municipais n. 7.629 e 7.670/2023 pelo Decreto Municipal n. 7.879/2024, também pelo princípio da autotutela, esclarecendo que não há outro normativo similar em âmbito municipal. Com a conclusão dos fatos, a Promotora de Justiça Fernanda Silva Villela Vasconcellos optou pelo arquivamento do inquérito civil.