Uma área institucional de um município é uma porção de terreno que, por exigência legal, deve ser destinada a uso público quando se aprova o loteamento de uma área urbana. Essas áreas são cedidas gratuitamente ao poder público pelo loteador e têm como finalidade atender ao interesse coletivo da comunidade. Ou seja, dentro de um loteamento (bairro), esses locais são destinados à instalação de equipamentos públicos como escolas, postos de saúde, praças, áreas de lazer, centros comunitários, entre outros.
Essas áreas são importantes para garantir que o crescimento urbano seja acompanhado de infraestrutura e serviços públicos adequados. Por exemplo, se um loteamento deixa de ter sua área institucional e dezenas de novas famílias passam a morar nos terrenos, a cidade pode ficar sem espaço para implantar esses serviços públicos, afetando diretamente a qualidade de vida da população. A construção de novas casas significa dezenas (ou centenas) de novos moradores. Isso aumenta a demanda por escolas, saúde, segurança, transporte e saneamento, por exemplo, mas sem oferecer o espaço necessário para atender a essa demanda.
Ocorre que, na cidade de Braço do Norte, um projeto de lei de autoria do Município foi aprovado pela Câmara de Vereadores na última sexta-feira (30/5), autorizando a desafetação de áreas institucionais de propriedade do Município, ou seja, a mudança da destinação original dessas áreas. A intenção é permitir a construção de aproximadamente 50 unidades habitacionais populares. As áreas abrangidas pela proposta estão localizadas em diversos loteamentos da cidade e incluem três matrículas com desafetação total e cinco com desafetação parcial, totalizando milhares de metros quadrados originalmente destinados ao uso coletivo.
O projeto de lei agora está com o prefeito da cidade para sancionar ou vetar, total ou parcialmente. Preocupado com a ilegalidade do ato e com a defesa dos direitos coletivos, o Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), por meio da 2ª Promotoria de Justiça de Braço do Norte, segue atuando para buscar soluções de maneira extrajudicial.
Nesta quarta-feira (4/6), a 2ª Promotoria de Justiça solicitou informações detalhadas à Prefeitura sobre o projeto de lei Ordinária nº 0023/2025, questionando se o texto será sancionado integralmente ou sofrerá vetos parciais. Também requer a apresentação da localização exata, em mapas oficiais do município, de cada área institucional que se pretende desafetar, bem como a forma de compensação prevista para essas áreas.
Além disso, o MPSC pede esclarecimentos sobre a existência de estudos que analisem a viabilidade (ou não) do uso de cada área para a instalação de equipamentos públicos e se há comprovação de que a desafetação não comprometerá o atendimento futuro da população. Solicita ainda a informação sobre a permanência de outras áreas institucionais nos respectivos loteamentos e se alguma das áreas desafetadas será destinada a moradores de um loteamento clandestino em área de risco no bairro Bela Vista, com os devidos detalhes.
A Promotoria de Justiça ainda solicitou a realização de uma reunião com a Prefeitura, que deverá ocorrer no dia 10 de junho para tratar do tema. O Município tem o prazo de cinco dias para responder aos questionamentos.
Inquérito e recomendação
A 2ª Promotoria de Justiça de Braço do Norte vem apurando a ilegalidade do projeto de lei ordinário n. 0023/2025 (substitutivo do projeto 0022/2025) que autoriza a desafetação de áreas institucionais de propriedade do Município de Braço do Norte para fins de construção de unidades habitacionais de interesse social desde que recebeu denúncias sobre a situação.
Ao verificar que o projeto de lei poderia entrar em pauta de forma extraordinária, a Promotoria de Justiça expediu uma recomendação à presidência da Câmara de Vereadores para que a votação fosse suspensa, tendo em vista a flagrante ilegalidade do projeto e o impacto negativo aos direitos coletivos da população. A Presidência da Câmara de Vereadores não acatou a recomendação.
Ocorre, porém, que o art. 17 da Lei Federal n. 6.766/79 veda a alteração da destinação das áreas públicas previstas nos projetos de loteamento aprovados e registrados. Esses terrenos, uma vez incorporados ao patrimônio público com finalidade específica, não podem ser alienados nem ter seu uso desviado, salvo em casos excepcionais e devidamente fundamentados, o que, para o MPSC, não se verifica na presente situação.
A destinação pública dessas áreas não pode ser ignorada, mesmo pelo próprio Poder Público Municipal, que recebeu tais bens gratuitamente no momento da aprovação dos loteamentos. A alteração proposta representa não apenas uma afronta à legalidade administrativa, mas também ao direito à cidade, à função social da propriedade urbana e ao equilíbrio ambiental, todos garantidos pela Constituição Federal.
A 2ª Promotoria de Justiça de Braço do Norte espera conseguir resolver a situação de forma consensual, já que o projeto de lei ainda não foi sancionado pelo prefeito da cidade. Por isso, requisitou informações e designou reunião para a próxima terça-feira (10/6). "É fundamental preservar essas áreas, pois a alteração proposta compromete a legalidade e a qualidade de vida da comunidade", ressalta a Promotora de Justiça Mariana Mocelin.