Para STF, é incabível detração penal de medida cautelar de recolhimento domiciliar noturno
Como sustentou MPSC, tempo de medida cautelar diversa da prisão preventiva não pode ser deduzido da pena em caso de condenação
O Supremo Tribunal Federal (STF) deu razão ao Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) e considerou que o tempo de medida cautelar de recolhimento domiciliar noturno não pode ser utilizado para fins de detração penal, que é o desconto do tempo que o réu esteve preso cautelarmente do tempo da pena em caso de condenação criminal.
A decisão do STF, ao julgar um recurso extraordinário interposto pela Coordenadoria de Recursos Criminais do MPSC (CRCRIM), foi contra o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) que deu parcial provimento ao recurso da defesa de um réu. Na decisão recorrida, a Corte estadual escorou-se em precedente da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), computando período de cautelar diversa da custódia, consistente no recolhimento noturno, para fins de detração penal.
No recurso extraordinário, o Ministério Público catarinense sustentou que o TJSC contrariou os princípios da separação dos poderes, da igualdade, da legalidade e da individualização da pena (arts. 2 e 5º, caput, e I, II, e XLVI, da CF). A CRCRIM argumentou que a equiparação de situações absolutamente distintas (recolhimento noturno em domicílio e pena privativa de liberdade) caracteriza evidente quebra do critério de justiça eleito pelo ordenamento jurídico.
"Desta feita, considerando que a medida cautelar alternativa constitui restrição aplicada a fim de garantir a liberdade do acusado, em homenagem ao princípio da proporcionalidade, sob o viés da adequação e da proibição da proteção insuficiente, não há razões aptas a justificarem o abatimento da pena privativa de liberdade", completou o Ministério Público.
Distribuído na Suprema Corte, o Relator, Ministro Alexandre de Moraes, deu provimento ao recurso extraordinário do Ministério Público (ARE n. 1.387.036/SC). Ao apreciar o mérito do recurso, o Ministro do STF acolheu a pretensão ministerial, no sentido de que "não há que se falar em detração penal do tempo em que o recorrente esteve em cumprimento de medida cautelar, consistente no recolhimento domiciliar noturno".
Segundo o Ministro, "Por força de lei, descabe detrair das penas o período de cumprimento de medidas cautelares diversas da prisão, porquanto o art. 42, do Código Penal, não prevê a aplicabilidade do benefício a esta hipótese, sendo, ainda, manifestamente contrária à lei a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para justificar a detração com base no fato de que algumas espécies de medidas cautelares comprometam o status libertatis do acusado".
Nesses termos, ponderou que "a medida aplicada ao paciente não comprometeu efetivamente o seu direito de locomoção, como alegado pela defesa, haja vista que foi determinado o recolhimento domiciliar noturno do paciente no claro intento de se ver garantida a aplicação da lei penal, tanto é que juntamente com essa medida foi também exigida a sua apresentação bimestral no Juízo originário".
Ademais, consoante o Ministro Alexandre de Moraes, "a Lei 12.403/2011, que introduziu as medidas cautelares diversas da prisão no processo penal, não previu a possibilidade da detração da pena em razão da aplicação dessas novas medidas".
Ao final, destacou ainda que "a jurisprudência desta Suprema Corte é no sentido de que a detração da pena privativa de liberdade não abrange o cumprimento de medidas cautelares diversas da prisão por falta de previsão legal (HC 205.740/SC, Rel. Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, DJe de 28/4/2022)", citando diversos precedente em igual sentido.
Essa decisão, em conjunto com recente precedente da Primeira Turma do STF (AgRg no HC n. 205.740/SC), evidencia que o STF não tem acolhido o entendimento do STJ a respeito da questão.