Locatelli salienta, ainda, que o desinteresse do poder público em resolver os problemas das ocupações irregulares fica mais evidente nos casos dos acordos judicias, "que eram ações que tramitavam há anos, algumas já com sentença, e houve a repactuacão para dar mais uma chance ao Município para cumprir essas decisões judiciais e regularizar as áreas objeto das ações ".
Em uma das ações em que houve o acordo judicial, o processo começou a tramitar em outubro de 2006. Desde então, houve uma série de decisões judiciais, sentenças e acordos nunca cumpridos pelo Município (Ação Civil Pública nº 0377558-53.2006.8.24.0023), sendo o acordo firmado em maio de 2019 a tentativa mais recente de uma solução efetiva e negociada, sem nova intervenção do Judiciário.
"Falta estrutura e vontade política para o reordenamento urbano. Os acordos acabam sendo assinados apenas para protelar uma solução, gerando um trabalho gigantesco nas promotorias que poderia ser canalizado para outros fins. É um achincalhe à instituição ministerial e aos institutos do ajuste de conduta e do acordo judicial, tornando esses instrumentos ineficientes, banalizando-os e forçando a movimentar a máquina do Judiciário para as execuções judiciais e gerando multas milionárias ao Município", avalia o Promotor de Justiça.
Regularização é prevista pelo REURB
Os acordos que acabaram ignorados pelo Municípío, tanto os judiciais quanto os extrajudicias, tentavam uma solução a situações previstas pela Lei Federal 13.465, da Regularização Fundiária Urbana (REURB). Esse regramento é aplicado nos casos de ocupações urbanas irregulares ou clandestinas já consolidadas, oportunidade em que se avalia se a remoção se impõe ou se não é mais possível desfazer as ocupações, com a recuperação dos eventuais danos ambientais ou questões relacionadas ao parcelamento de solo e urbanismo sem que haja um prejuizo social ainda maior, por exemplo.
Segundo as ações de execução, a REURB visa a "identificar os núcleos urbanos informais, organizá-los e assegurar a prestação de serviços públicos aos seus ocupantes, de modo a melhorar sua qualidade de vida; garantir o direito social à moradia digna e às condições de vida adequadas; e ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem estar de seus habitantes".
Nesse sentido, a maior parte das obrigações do Município nesses acordos se refere à regularização fundiária; exigência de compensações urbanísticas, ambientais ou até mesmo indenizações, quando fosse o caso, ao Fundo Municipal de Desenvilvimento Urbano; e até mesmo providenciar, viabilizar ou cobrar a implantação de equipamentos e serviços públicos e comunitários.
Diante disso, as multas, segundo o Promotor de Justiça, podem ser revertidas ao Fundo de Reconstituição de Bens Lesados (FRBL), como previsto inicialmente, ou os valores poderiam ser aplicados diretamente em projetos e inciativas que visem ao bem estar-social social das comunidades afetadas.