Decisão liminar, que atende ação civil pública do MPSC, também proíbe o município de emitir qualquer documento que permita a ligação de energia com base na lei 10.384/2018. Só nos dois últimos anos mais de 4.100 novas ligações elétricas foram realizadas em Florianópolis em desacordo com as normas básicas de ordenamento urbanístico e ambiental.
A Centrais Elétricas de Santa Catarina (Celesc) não pode realizar novas ligações de energia em construções clandestinas ou irregulares em Florianópolis. A decisão liminar da 3ª Vara da Fazenda Pública da Capital, que atende ação civil pública do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), também proíbe o município de Florianópolis de emitir qualquer documento que permita a ligação de energia com base na lei 10.384/2018.
O MPSC vem apurando a situação, considerada pela 32ª Promotoria de Justiça como uma epidemia de loteamentos clandestinos, invasões, construções irregulares e clandestinas em diversos bairros da Capital, desde 2016. Para tentar impedir a proliferação do problema, uma vez que um dos principais fomentadores dessas edificações era o fornecimento de energia elétrica pela Celesc, a Promotoria de Justiça tentou a via extrajudicial. Foi sugerido um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para empresa, porém, a CELESC optou por não aderir. Alegou que continuaria realizando as ligações até que houvesse determinação judicial que a proibisse.
O Município, por sua vez, tentou driblar a atuação do Ministério Público e contornar as normas vigentes com edição de decretos ilegais e lei inconstitucional. O Decreto 17.603/2017, por exemplo, permitia a ligação de energia elétrica em edificações clandestinas ou ilegais desde que obedecesse pré-requisitos básicos. Diante da norma flagrantemente ilegal, a 32ª Promotoria de Justiça, a 28ª Promotoria de Justiça e o Centro de Apoio Operacional do Meio Ambiente encaminharam recomendação ao Município e à CELESC para a regularização das ações envolvendo a ligação de energia e revogação do Decreto.
Assim como no TAC, a CELESC afirmou que não acataria a recomendação sem prévia ordem judicial. Já o Município de Florianópolis assegurou que revisaria o Decreto. De fato, um novo Decreto foi editado (n. 18.229/2017), mas sem atender por completo a recomendação do MPSC. Em seguida, porém, foi revogado pela Lei Municipal 10.384/18, uma norma muito mais devastadora que as antecessoras, diz o Promotor de Justiça, pois permite ligações de energia nas edificações que não tenham alvará ou habite-se, desde que não estejam em área de preservação permanente ou área de risco atestado pela defesa civil.
Tais normas, especialmente a Lei 10.384/18, permitiram, segundo documentos da CELESC e do Município remetidos ao MPSC, que mais de 4.100 novas ligações elétricas fossem realizadas na Capital nos últimos dois anos em desacordo com as normas básicas de ordenamento urbanístico e ambiental. "São edificações erigidas sem qualquer controle fiscalizatório, expondo não só os moradores, como todo entorno a graves riscos ambientais, urbanísticos, sanitários e até mesmo estruturais, ante a completa imprevisibilidade da estrutura que sustenta a construção", ressalta o Promotor de Justiça Alceu Rocha.
No mérito da ação, o MPSC requer a inconstitucionalidade e a ilegalidade da Lei 10.384/18, uma vez que afronta a Constituição Federal, a Constituição Estadual, o Estatuto da Cidade, a Lei estadual 17.492/18, que trata do parcelamento do solo e das novas modalidades urbanísticas, e a resolução da ANEEL 414/2015.
Para o Juiz de Direito Marco Aurélio Ghisi Machado, da 3ª Vara da Fazenda Pública, estão evidentes não só a atuação irregular da Celesc e do Município, mas também a sua resistência na observância das normas ambientais e municipais. "Destarte, deve-se sobrelevar o dever de proteção ao meio ambiente (CF, art.225), determinando-se o imediato cumprimento das condições indicadas pelo autor" (da ação), escreveu o Juiz na decisão.
Dessa forma, a Celesc tem que se abster de realizar em Florianópolis novas ligações de energia, sem prévia apresentação, pelo solicitante, de alvará de construção (para as ligações provisórias destinadas à execução de obras, apenas pelo prazo máximo definido no alvará) ou de habite-se, bem como quando se tratar de parcelamento de solo clandestino ou irregular ou área de ocupação irregular, sob pena de multa de R$ 30 mil por ocorrência.
Já o Município não pode emitir qualquer documento à Celesc que autorize a ligação de luz com respaldo na Lei 10.384/2018, exceto o alvará de construção para as ligações provisórias destinadas à execução de obras, com prazo definido no alvará, sob pena de multa de R$ 10 mil por ocorrência. Cabe recurso da decisão. (0900015-65.2019.8.24.0023)