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A coleta de resíduos sólidos e recicláveis é um benefício ao cidadão e ao meio ambiente. Mas, em Ituporanga, supostas irregularidades nesse serviço viraram alvo do Ministério Público catarinense. O resultado foi a condenação por improbidade administrativa de sete pessoas e da então prestadora do serviço. A decisão da Justiça atende a uma ação civil da 2ª Promotoria de Justiça da comarca. O esquema foi investigado na Operação Reciclagem, do Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (GAECO), deflagrada em 2018 para apurar crimes de corrupção na coleta de resíduos em Santa Catarina. A sentença é datada de 4 de julho. Pelos mesmos fatos, cinco dos réus foram condenados anteriormente em ação penal. 

Entre as irregularidades apontadas na investigação estão a dispensa irregular de processo licitatório, contrato indevido com prorrogação ilegal, bem como fraude e falsificação de documentos, com o intuito de falsamente aumentar a quantidade de lixo recolhida no município e supostamente beneficiar a empresa agora condenada. 

A decisão da 2ª Vara da Comarca de Ituporanga condenou o ex-prefeito Osni Francisco de Fragas (gestão 2017-2020), o ex-secretário municipal da Fazenda Arnito Sardá Filho e os representantes da empresa ré, Schirle Scottini, Arnaldo Muller Junior e Adriana Alinda Scottini à perda de valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, além de multa equivalente a essa quantia para cada um. O Juízo ainda determinou a suspensão dos direitos políticos por 14 anos para esses cinco réus e a perda de eventual função pública que estejam exercendo. Além disso, estão proibidos de fazer contrato com o poder público, receber benefícios ou incentivos fiscais ou crédito, de maneira direta ou indireta, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócios majoritários. Eles também têm que ressarcir integralmente o dano patrimonial causado aos cofres do Município de Ituporanga. 

O ex-secretário de Urbanismo de Ituporanga Leandro May e o servidor público municipal Luiz Carlos Back foram condenados, por um ano cada um, à perda dos direitos políticos e de firmar contrato com o poder público, receber benefícios, incentivo fiscal, ou crédito, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócios majoritários. 

A empresa Saay's Soluções Ambientais Ltda. foi sentenciada à perda dos valores advindos do superfaturamento. Esses valores serão apurados na liquidação da sentença. A prestadora de serviço também foi condenada à suspensão parcial de suas atividades, consistente na proibição de participar de licitações e de processos de inexigibilidade de licitação, firmar contratos com o poder público e prestar serviço que tenham reflexo em atividade ou serviço público, pelo prazo de cinco anos, com exceção dos contratos já assinados. Pelo mesmo período está proibida de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos ou entidades públicas e de instituições financeiras públicas ou controladas pelo poder público. 

A Justiça manteve a indisponibilidade de bens dos envolvidos, com exceção de Leandro May e Luiz Carlos Back, que não foram condenados às sanções pecuniárias. As medidas liminares no curso do processo determinam a indisponibilidade de bens de cinco réus e da empresa no valor de R$ 3.699.545,52. 

Entenda o caso 

A ação civil pela prática de ato de improbidade administrativa ajuizada pela 2ª Promotoria de Justiça da Comarca de Ituporanga relata que, tão logo tomou posse, Fragas fez uma reunião com representantes da empresa para tratar da terceirização da coleta de lixo. Em 10 de março, foi aberta a concorrência na modalidade de dispensa de licitação. O processo teria sido direcionado à empresa Say Muller Serviços Ltda., cujos representantes legais são os réus Arnaldo Muller Junior e Adriana Scottini. 

Conforme os autos, tanto o prefeito quanto os secretários da Fazenda e de Urbanismo e o servidor Luiz Carlos Back - encarregado do contrato - sabiam do favorecimento à empresa de Schirle. O contrato foi homologado cinco dias depois. A prestadora de serviço faria a coleta pelo prazo de três meses. O valor estimado seria de R$ 112.83 por mês. Pela tonelada recolhida seriam pagos R$ 327,00. 

O contrato foi prorrogado posteriormente até 22 de agosto do mesmo ano por meio de um termo aditivo. Depois, o prazo foi estendido até novembro. Ao fim do contrato, mais uma vez, houve a dispensa de licitação e foi firmado um contrato com a empresa por mais 180 dias, com valor estimado em R$ 834.435,00, e assim continuaram as prorrogações contratuais. 

Se extrai da denúncia que a justificativa de situação de emergência na coleta de lixo no município para embasar a dispensa de licitação e possibilitar a contratação do serviço terceirizado foi elaborada pela própria empresa contratada. Até o fim de 2016, a coleta era feita pelo poder público, sem apresentar nenhum problema.  

Como se não bastasse a contratação irregular da empresa, com a intenção de aumentar a rentabilidade do contrato, os réus, de acordo com a denúncia do Ministério Público, passaram a forjar a quantidade de lixo recolhido para aumentar o valor dos pagamentos mensais. Com a operação da empresa na prestação do serviço de recolhimento de resíduos teria havido uma grande escala de crescimento na coleta, saltando de 350 toneladas em janeiro de 2018 para 500 toneladas no mesmo mês em 2019 - um aumento de 30% em um ano. Nesse período, a empresa era remunerada conforme a quantidade de lixo recolhido. Os resíduos orgânicos rendiam R$ 329,85 a tonelada, enquanto a tonelada dos recicláveis era estimada em R$ 623,03. 

Operação Reciclagem 

Essa já é a segunda condenação para cinco réus do caso. O ex-prefeito de Ituporanga Osni Francisco de Fragas, o ex-secretário da Fazenda municipal Arnito Sardá Filho e os empresários Arnaldo Muller Júnior, Adriana Olinda Scottini e Schirle Scottini, representantes da empresa da Say Muller Serviços Ltda., já haviam sido condenados após o resultado da Operação Reciclagem, do GAECO, deflagrada em 2018 para apurar suposta corrupção entre agentes públicos do Município de Bombinhas e a empresa Say Muller. Com o avanço das investigações, chegou-se à suposta fraude ligando a empresa a agentes públicos de Ituporanga. A decisão da 2ª Vara da Comarca de Ituporanga foi proferida no dia 28 de agosto de 2023, atendendo a uma ação penal do MPSC. 

Foi apurado na investigação do GAECO que, em pelo menos em 16 oportunidades, a comprovação da pesagem teria sido falsificada. Os tíquetes apresentados pela Say Muller não existiam nos arquivos da empresa onde os caminhões de lixo eram pesados para aferir o valor devido pelo Município. Tíquetes teriam sido fabricados para simular pesagens e garantir a obtenção de maiores lucros. 

O ex-prefeito foi condenado a 10 anos, quatro meses e 20 dias de reclusão pelos crimes de peculato, corrupção passiva e organização criminosa, além de 25 dias-multa. Pelos mesmos crimes, o ex-secretário da Fazenda recebeu pena de 10 anos e dois meses de reclusão e 24 dias-multa. A empresária Schirle Scottini foi condenada a 10 anos, sete meses e 20 dias de reclusão, bem como a 25 dias-multa, por crime organizado, corrupção ativa e peculato. Arnaldo Muller Júnior e Adriana Scottini pegaram pena de 10 anos e 20 dias de reclusão também por corrupção ativa, peculato e organização criminosa, com pagamento de 24 dias-multa. O valor de cada dia-multa é calculado sobre o maior salário mínimo vigente no país na época dos fatos, com aplicação das correções monetárias.

Processos n. 5002887-54.2019.8.24.0033/SC e n. 5000527-78-2021-8.24.0035/SC