"Quando eu vi ela entrando pela porta da Casa Lar, eu senti: aquela mulher ali vai ser a minha mãe". Essa foi a primeira vez que Willian Vieira Schmitt, na época com nove anos, viu Grasiela Schmitt. Durante a entrevista entre a mulher e representantes da Casa Lar de Florianópolis, o garoto, hoje com 13 anos, ficou espiando pela janela, curioso para ver o rosto daquela que, em breve, seria oficialmente sua mãe. Desde muito jovem, Grasiela tinha certeza de que a maternidade viria por meio da adoção: "Eu nunca me vi mãe de recém-nascido". A princípio, quando a mulher decidiu entrar na fila de adoção, definiu que gostaria de adotar crianças entre três e seis anos. Cinco anos mais tarde, ela aumentou a faixa etária para até nove anos. Um mês depois, Willian já estava morando junto da mãe.
"Foi obra do destino, foi Deus. Era o que eu mais queria - ter uma figura materna do meu lado", relembra ele. "Eu sei que muitos pais têm medo de adotar crianças mais velhas por medo de elas não se adaptarem a essa nova vida, mas comigo e com a minha mãe foi diferente. Inclusive eu até gosto de chegar para os meus amigos e dizer: `eu sou adotado`", completa Willian.
Apesar de toda a emoção e o carinho mútuo demonstrado pela família, a adoção de crianças com idade superior a seis anos segue como exceção em Santa Catarina. Esse tipo de atitude se enquadra na categoria "adoção tardia". Atualmente, existem 244 crianças e adolescentes de quatro a 16 anos disponíveis para adoção no estado, o que corresponde a 90% do total de 271 bebês, crianças e adolescentes aguardando adoção. Em contrapartida, 1.368 pessoas, ou seja, 48,8% dos pretendentes à adoção têm preferência por crianças de zero a quatro anos. Os dados são do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento do Conselho Nacional de Justiça.
O Coordenador do Centro de Apoio Operacional da Infância, Juventude e Educação (CIJE) do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), Promotor de Justiça Mateus Minuzzi Freire da Fontoura Gomes, diz: "O que a gente sempre pede é que as pessoas não pensem que amor e afeto têm uma idade limite. Toda criança pode encontrar uma referência de pai e de mãe, seja com um, três, 10, 15 anos de idade. O que ela quer é poder deitar na cama e ter alguém para poder dizer `boa noite, pai`, `boa noite, mãe`, `eu te amo`. Quando as pessoas se dispõem a adotar, elas podem dar um lar, criar uma conexão muito especial e muito importante com uma criança ou adolescente que sofreu muito e que não tem culpa disso. Não importa a idade; importa o afeto, que pode ser construído em todos os momentos da vida".
Nesse âmbito, é importante destacar que o termo "adoção tardia" não é previsto legalmente. Entretanto, o Coordenador do CIJE esclarece que o conceito faz menção a uma situação comum vivenciada por profissionais envolvidos no acolhimento e na adoção. "Quanto maior a idade da criança ou do adolescente, menor é o potencial de adoção, ou seja, quanto maior o nível de autonomia e percepção da realidade da criança ou do adolescente, mais difícil é a adoção. Normalmente a partir dos três anos existe uma barreira maior para conseguir", explica.
Nos últimos cinco anos, 909 bebês e crianças de até dois anos foram adotados em território catarinense. Conforme a idade das crianças e adolescentes vai aumentando, o número de adoções cai vertiginosamente: apenas sete adolescentes maiores de 16 anos foram adotados no período. Todas as 2.430 adoções tiveram participação efetiva do Ministério Público catarinense.
Atualmente, 225 crianças e adolescentes estão em processo de adoção no estado. São 69 bebês e crianças de zero a dois anos, 37 crianças de dois a quatro anos, 31 de quatro a seis anos, 29 de seis a oito anos, 22 de oito a dez anos, 16 de dez a doze anos; 15 de doze a catorze anos e 6 de catorze a dezesseis anos. Não há registros de adoções em andamento de jovens com mais de 16 anos.
Como o MPSC participa do processo de adoção?
Os Promotores de Justiça com atribuição na área de infância e juventude atuam diretamente nos casos de jovens acolhidos. Quando a criança ou adolescente está em situação de vulnerabilidade, os membros do MPSC encaminham judicialmente uma medida de proteção e possivelmente uma medida de destituição do poder familiar. Apesar da definição do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) de que jovens não devem permanecer acolhidos por mais de 18 meses, salvo em casos fundamentados pela autoridade judiciária, a maioria permanece no sistema de acolhimento por mais tempo.
Nesse âmbito, os Promotores de Justiça adotam medidas extrajudiciais e judiciais para a garantir a convivência familiar e comunitária do acolhido, preferencialmente encaminhando-o para o serviço de acolhimento familiar. Os membros do Ministério Público inserem as crianças e adolescentes em programas de visibilidade para adoção, inclusive na busca ativa, e colocam os acolhidos em programas de apadrinhamento. Inserir os adolescentes em programas de aprendizagem e de qualificação profissional também é função dos Promotores de Justiça. Além disso, os profissionais também são responsáveis por inspecionar pessoalmente os serviços de acolhimento familiar e institucional de seis em seis meses. A partir da inspeção, o membro do MPSC produz um relatório que é encaminhado para a Corregedoria-Geral do Ministério Público.
Durante o processo de adoção, o MPSC também elabora um parecer sobre os interessados. Esse documento, acompanhado de um laudo técnico da equipe da Vara da Infância, embasa a decisão do Juiz. A partir disso, o nome dos interessados passará, ou não, a constar no cadastro nacional. Dessa forma, os pretendentes habilitados são adicionados automaticamente à fila de adoção e aguardam até aparecer uma criança com o perfil definido. Nos casos de adoção, os Promotores de Justiça também acompanham as crianças, adolescentes e jovens desligados do serviço de acolhimento por, no mínimo, seis meses.
Em todas essas etapas do processo, o Centro de Apoio Operacional da Infância, Juventude e Educação oferece suporte para os Promotores de Justiça. Esse auxílio é referente tanto a casos individuais quanto à criação de programas e projetos que impactem positivamente a adoção.